Como todos sabemos, há duas formas diferentes de olhar para o mesmo copo, meio cheio ou meio vazio, ainda assim, o copo é sempre o mesmo, exatamente o mesmo.
Há também duas formas diferentes de estar na vida, uma mais passiva, em que nos colocamos do lado do espetador, aparentemente mais confortável, e a outra, em que assumimos um papel ativo e, portanto, passamos para o outro lado, o lado do ator, assumindo responsabilidade ativa no desenvolvimento dos acontecimentos, naturalmente, numa posição mais arriscada.
Do lado do copo vazio está o muro das lamentações, a inveja da galinha da vizinha ou, pior que tudo, as críticas àqueles que fazem um esforço para, libertando-se desta ladainha, tentarem ver o copo tal como ele é. Este capital de queixa, fácil e populista, é uma melodia que fica no ouvido e se alimenta da passividade daqueles que se colocam do lado do espetador, furtando-se a arriscar um papel pró-ativo, com a mesma facilidade com que apontam o dedo a cidadãos, movimentos de cidadãos (genuínos), profissionais, políticos, pensadores, empreendedores, entre outros, que, no âmbito das suas convicções, funções ou profissões, tentam contrariar a falta de orgulho que outros tantos teimam em continuar a semear.
A nossa região, o Baixo Alentejo, e o seu processo de crescimento e desenvolvimento têm sido disso um exemplo, infelizmente para todos.
Muitos de nós ainda nos lembramos de um passado, não assim tão distante, em que tudo (ou quase tudo) estava ainda por fazer, numa região que definhou durante décadas, encostada a um celeiro da nação cujos dias se sabiam estar contados. Era um tempo em que em muitas casas não havia água canalizada, esgotos ou energia, não havia escolas, bibliotecas ou centros de saúde, não havia barragens nem regadio, não havia aeroportos, pontes, autoestradas, não havia Internet, não havia quase nada … outros tempos. Havia, ainda assim, mais orgulho, muito orgulho, no pouco que se tinha e naquilo que se foi conseguindo e construindo.
Felizmente há sempre quem passe da plateia para o palco, de espetador para ator, há sempre quem veja o copo meio cheio ou, mais importante do que isso, não se importe de ajudar a enche-lo em vez de ficar a vê-lo secar, pouco a pouco, até ficar vazio.
Cada vez que desvalorizamos o Baixo Alentejo, cada vez que o fragilizamos com guerras, agendas e objetivos pessoais, estamos a dar uma machadada no nosso destino coletivo enquanto comunidade, enquanto povo.
A luta dos últimos anos prova que não será fácil: os problemas existem, as adversidades também, as externalidades negativas que não conseguimos controlar muitas vezes fragilizam-nos, é verdade, mas as soluções possíveis também estão aí.
Tal como água encheu a albufeira de Alqueva, contra os arautos da desgraça, também as nossas azeitonas, amêndoas, uvas ou frutos vermelhos chegaram aos quatro cantos do mundo, contra os resignados do sequeiro.
Tal como os navios de mercadorias vão continuar a chegar ao porto de Sines e as suas mercadorias escoadas por uma nova linha de comboio, também a nossa localização estratégica privilegiada, encostada ao litoral e à fronteira com Espanha, irá estimular o aumento das relações comercias, contra aqueles que viam a fronteira como um muro e não uma porta.
Complementarmente, o nosso património cultural e natural continuará a receber os selos da Unesco, contra os que negavam as suas próprias raízes, também o turismo rural, gastronómico, cultural, de saúde, de natureza vai continuar a crescer, contra os que insistem em desvalorizar o potencial dos nossos recursos próprios, assim como a produção de energia solar e eólica vai continuar a aumentar, contra os que vaticinavam o seu fim.
Tudo isto, ao mesmo tempo que os aviões cruzarão os céus do Baixo Alentejo, de e para Beja, aumentando os postos de trabalho diretos e indiretos e a atividade comercial em torno da infraestrutura aeroportuária do Baixo Alentejo. Também não é menos verdade que teremos um hospital central para o Alentejo, descentralizando importantes cuidados de saúde, aproximando-os do Baixo Alentejo.
Como não é menos verdade que os comboios irão circular nas linhas eletrificadas, ou os carros circularão nas autoestradas. Tudo isto a tempo de muitos de nós, e dos nossos filhos, ainda podermos acompanhar este salto civilizacional que os nossos pais e os pais deles nunca sonharam ter.
Não são naturalmente promessas, são certezas sustentadas pela forte convicção de quem, desde há muito, passou da plateia para o palco.
Um processo de construção e crescimento, à vista de todos, mas que muitos insistem em não ver, ou em não querer ver, negando o que está a acontecer à sua volta, presos à cadeira do espetador, a olhar para o copo meio vazio.

Texto publicado no Diário do Alentejo