A pandemia escancarou uma crise comportamental, sanitária e econômica, segundo o economista Thomas Conti
Comportamental, sanitária e econômica. Esta é a crise tripla que se instaurou no mundo todo por conta do novo coronavírus, segundo o professor de economia do Insper Thomas Conti, que publicou um estudo analisando, pela ótica econômica, as respostas dadas à pandemia.
Em sua avaliação, o Brasil poderia ter aproveitado a vantagem de o vírus ter se originado na Ásia para se preparar melhor, mas pecou em um ponto-chave: a comunicação honesta com a população.
Esse erro, segundo o economista, pode levar o país para uma “tragédia de grandes proporções” nas três variáveis da crise tripla.
“Não existe nenhuma alternativa para as políticas públicas que não dependa invariavelmente do compromisso e convencimento da população. Sem isso, não há nenhuma estratégia sanitária ou econômica que possa dar certo”, diz.
Em entrevista à EXAME, Conti fala sobre a urgência de um alinhamento de discurso entre os governantes do país e a incerteza sobre a magnitude da crise econômica, além de destacar que as consequências no futuro dependem das decisões tomadas agora.
Leia os principais trechos da entrevista:
O seu artigo classifica a pandemia de coronavírus como uma crise tripla. Por que essa divisão?
O cenário da pandemia deixa claro que não existe nenhuma alternativa para as políticas públicas que não dependa do compromisso e convencimento da população, de respeitar regras de higiene e de aglomeração. Sem esse compromisso, não tem nenhuma estratégia que vá dar certo.
As pesquisas científicas mostram: não precisa haver um percentual grande de pessoas que descumpram as regras para que as medidas sanitárias deixem de funcionar. Por isso que começo com a crise comportamental.
As consequências do coronavírus vão ficar até o fim do ano, no melhor dos cenários. Mas também é uma crise comportamental para os próprios governantes, que nunca passaram por uma situação dessas e têm que mudar o comportamento, ser ágil, transparente e se comunicar.
Já a crise sanitária, é o colapso inevitável da saúde. Não tem nenhum sistema de saúde no mundo que aguenta o impacto dessa pandemia. E a crise econômica é de incerteza máxima.
Sua análise é que o país não retornará à normalidade tão cedo e que as próximas semanas serão de um “clima social próximo de um estado de guerra”. A população está preparada para isso?
O Brasil tinha uma vantagem grande, porque o vírus não chegou aqui primeiro. Podemos ver o que aconteceu em outros países; na Coreia do Sul, Singapura, Vietnã e Alemanha, por exemplo, os governantes foram muito claros com a população desde o começo. Falaram que seria precisa fazer um esforço prolongado para não sobrecarregar o sistema de saúde.
Nos pronunciamentos do primeiro-ministro de Singapura, ele mostra a gravidade do problema e o que está sendo feito para evitar pânico na população. Deixa claro que as pessoas precisam estar preparadas para ter que fazer uma quarentena de urgência, cita os riscos de aglomerações.
O que nós estamos fazendo? O Brasil está criando conflitos internos que não precisaria ter. Os governadores de todos os estados tentaram se alinhar em uma estratégia comum, mas isso não durou. Não temos muito tempo para mudar isso e os custos sanitários e econômicos serão altíssimos.